domingo, 1 de maio de 2011

Há fogo. É uma condição de ser um pássaro de grande poder e luminescência. Há, e não é necessário que se fuja dele, um fogo que o consome como quem come e come. Ele sente a eterna asia de queimar seus próprios pensamentos. Queimar suas próprias penas a cada minuto e, tão dolorosamente como as águias arrancam o próprio bico, fazer nascer as novas de dentro de um eu ferido e cheio de bolhas que jamais deixa de ser e é a cada minuto. A cada minuto, a cada minuto, todo o tempo. Há de se entender que o poder não é só o ter, mas o sofre-lo. Já não mais parece duro e maldoso dizer isso. Esse pássaro é assim, e já o é sabido.

Acontece que, numa noite mais vermelha que o comum, seu voo era baixo e fraco. O fogo, que jamais deixa de haver, lhe cobria os olhos e não existia decisão. Restava o voar triste de não saber onde ir. Cair para o mais intenso abaixo de si era um perigo vivo.  Seu fogo cessaria, sua garganta engasgaria e o sal lhe queimaria as avessas; como uma dor alcalina. Mas não havia decisão, só impulso. Só medo. Só cegueira.

Sabe-se de que pássaro está-se falando. Mergulhou fundo, mentira, deixou-se cair profundo para uma morte mais dolorida que sua vida. A água mata lento, com um desespero calmo de jamais queimar, mas desfalecer com frio. Foi necessário cada pena cair. Então a pele, à mostra, enrugar. O corpo todo se encolher, feio e escuro, como se encolhem simples frangos numa mesa. Ultraje!Foi necessário que as garras inchassem, moles e inúteis, para a morte acontecer; sem jamais deixar de cair e morrer.

Como matar uma criatura imortal? Não há, no mundo, para a Fennix, uma morte definitiva. Não há, nesse universo, fim para o fogo. O fogo é infindável. É rídiculo e nasce todos os domingos no topo de alguma colina. Ainda mais poderoso, ainda mais invisível e colorido. Belo é pouco. E vivo toda manhã. E só.